terça-feira, 19 de abril de 2011

A tragédia da escola do Realengo: momento de dor e de ação propositiva

Amanhecemos sexta-feira, 8, em luto nacional: 12 crianças e jovens assassinadas por um outro jovem, ex-aluno da Escola Municipal Tasso da Silveira no bairro de Realengo, Rio de Janeiro. O Brasil chora e lamenta a tragédia ocorrida em um momento de vigência de um governo democrático, com ampliação da participação social na esfera da proposição de políticas públicas.

Contudo, a violência tem sido um marco que permeia a vida cotidiana das classes populares, na rua, no trabalho e nas escolas. A desigualdade e exclusão social combinadas às práticas do preconceito e intolerância tem vitimizado inúmeros grupos sociais tais como afrodescendentes, mulheres, LGBT e indígenas, dentre outros.

Nossas crianças e jovens são alvo da violação de direitos em diversas situações: abuso e exploração sexual, trabalho infantil, sendo os jovens pobres vítimas de homicídios diários e da drogadição. Neste contexto social, a escola é o lugar da socialização e do aprendizado de valores humanos, da percepção do outro e da consciência social, ao mesmo tempo em que vivencia práticas de agressividade e discriminação. Os conflitos escolares tem sido um desafio para a vida cotidiana das instituições educacionais, desde os pequenos desentendimentos interpessoais até as ameaças e mortes ocorridas nestas instituições em todo o país.

As práticas de mediação dos conflitos escolares por meio da capacitação de alunos, professores e funcionários tem contribuído para transformar a escola em um espaço de convivência através do diálogo, da participação e do afeto, instituindo práticas educativas pautadas nos direitos humanos.

Desde 1993, o Brasil possui o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos voltado para cinco áreas: educação básica, educação superior, educação não-formal, educação dos profissionais de justiça e segurança e educação e mídia. Seus objetivos incluem a construção de uma sociedade justa, igualitária e democrática por meio da implementação da transversalidade dos direitos humanos na educação e nas políticas públicas. Seu eixo central é a afirmação de valores, atitudes e práticas sociais capazes de constituir uma cultura de direitos humanos em todos os espaços da sociedade e do Estado.

Alguns passos concretos foram dados com a criação de comitês estaduais e municipais de educação em direitos humanos, a capacitação de professores da educação básica e de lideranças comunitárias, estando neste momento a proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação em Direitos Humanos no Conselho Nacional de Educação para deliberação pelos seus membros.

Essas medidas, especialmente as Diretrizes Curriculares Nacionais, pretendem contribuir para que as escolas de educação básica e as instituições de ensino superior assumam o compromisso constitucional de formar cidadãos conscientes e críticos, e também, tornar cada estudante um sujeito de direitos capaz de participar de uma sociedade livre, democrática e tolerante com as diferenças de orientação sexual, gênero, físico-individual, geracional, étnico-racial, cultural, religiosa, territorial, de opção política, de nacionalidade, dentre outras.

Esta tragédia da escola pública do Realengo não é um acontecimento cotidiano, mas um fato inusitado. Ações propositivas no sentido de formação para a cidadania são instrumentos valiosos para tornar os espaços educativos locais onde possam florescer relações sociais afetuosas, capazes de sustentar a alegria de viver um processo de aprendizagem participativo e pautado nos valores da liberdade, igualdade, justiça e solidariedade.

Nair Heloisa Bicalho de Sousa

A autora do texto é professora do Departamento de Serviço Social, da Universidade de Brasília e coordenadora do Núcleo de Estudos para a Paz e Direitos Humanos, da mesma universidade. Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo, mestrado em Sociologia pela Universidade de Brasília, doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado na Faculdade de Educação da USP.

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