Rio -  A cada colher de arroz e feijão que oferece ao filho, a mãe do pequeno X., de 9 meses, afasta a sombra da fome de sua casa, na Favela Nova Brasília, no Complexo do Alemão. Mas nem sempre foi assim. Para garantir a alimentação da criança através da pensão do pai, ela recorreu ao Núcleo de Mediação e Resolução de Conflitos do Ministério Público do Rio. A. é uma das 164 pessoas de áreas pacificadas que procuraram o órgão, nos últimos quatro meses, para tentar solucionar divergências judiciais através do diálogo. Antes da pacificação isso era praticamente impossível, devido ao domínio do tráfico nas comunidades.

A mãe de X. conseguiu acordo e ganha R$ 100 mensais do ex-marido para ajudar a alimentar o filho | Foto: Paulo Araújo / Agência O Dia
A mãe de X. conseguiu acordo e ganha R$ 100 mensais do ex-marido para ajudar a alimentar o filho | Foto: Paulo Araújo / Agência O Dia
Apesar de o trabalho no núcleo ter começado há meses, só em dezembro foi assinado o convênio com a Secretaria de Segurança Pública para recrutar mão de obra policial. Com 58 PMs em 28 UPPs, o número de ‘soluções’ disparou. Nos primeiros 20 dias, foram 118 atendimentos. Na sede do MP, foram sacramentados outros 46 acordos.

“Quando me separei, ele parou de ajudar. Os policiais me chamaram e negociamos. Terei R$ 100 por mês”, elogiou A., que chegou ao acordo em menos de duas semanas.

A Favela da Rocinha é campeã de atendimentos, sendo os conflitos entre vizinhos os mais comuns. Divergências em âmbito escolar e familiar vêm em seguida. A Rocinha pode ganhar seu próprio núcleo. As ações abrangem questões do Juizado Especial Criminal, de violência doméstica, tutela coletiva, infância e adolescência e meio ambiente.

Além de levar democracia a áreas antes dominadas pelo tráfico, a medida desafoga o Judiciário. “Na política do medo, a última palavra era do tráfico. Agora, o morador pode conversar e atingir o consenso”, revela a promotora Eliane de Lima, subcoordenadora do núcleo.

Polícia cria nova relação com morador

O mediador não tem poder de decidir, apenas de facilitar a comunicação entre as partes e ajudar a criar opções para os problemas. Com este propósito, os policiais devidamente capacitados por cursos do Tribunal de Justiça vêm construindo uma nova relação com os moradores das áreas pacificadas e um novo cenário nestas comunidades.

“O grande mérito da mediação é ser uma ferramenta de rápida conclusão e desenvolver a prevenção de eventuais crimes”, define o capitão Leonardo Mazzurana, que é subcoordenador de ensino e pesquisa da CPP.

“Além de ser um ganho de democracia e de direitos que eles não tinham antes, pelo próprio acesso à Justiça, sai a polícia de confronto e entra a que consegue resolver os problemas na base da conversa”, elogia a coordenadora do Núcleo de Mediação do MP, a procuradora de Justiça Anna Maria de Masi.


Fonte: O Dia online